Louise Haufes, especialista em direito de família / Foto: Divulgação

É muito provável que a pergunta “Como será o mundo pós-pandemia?” esteja atormentando a mente de quase todas as pessoas, mas não em relação apenas às questões de saúde e economia. Na advocacia, por exemplo, os efeitos da covid-19 mudaram a atuação dos profissionais, trazendo aumento de ações nas áreas de direito de família, trabalhista, consumidor e imobiliário.

Um exemplo claro desse cenário é o aumento no número de divórcios extrajudiciais. De janeiro a maio deste ano, 29.985 separações registradas em cartórios de notas de todo o país, um crescimento de 26,9% em relação ao mesmo período de 2020, segundo o Colégio Notarial do Brasil (CNB).

A tendência de alta também é registrada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Segundo a entidade, o número de divórcios no país cresceu 75% em cinco anos e, no meio do ano passado, o total de divórcios saltou para 7,4 mil apenas em julho, um aumento de 260% em cima da média de meses anteriores.

“A pandemia nos apresentou diversas dimensões do seu impacto, tanto na saúde pública e na economia quanto nas relações humanas. E na nossa profissão não foi diferente. Ainda estamos vivenciando a crise da covid-19, mas ela, sem dúvida, já produziu efeitos muito claros na advocacia, transformando o jeito de fazer direito diariamente. E isso não necessariamente é algo ruim, pois pode nos levar por um caminho de uma advocacia mais moderna, ágil e próxima da sociedade”, avalia Márcio Nogueira, pré-candidato à presidência da Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional Rondônia.

Na quarta reportagem da série especial “Advocacia em Pauta”, profissionais do direito mostram os efeitos do novo coronavírus na forma de atuação da advocacia rondoniense, contando casos concretos vivenciados em seus escritórios.

EXPLOSÃO DE DIVÓRCIOS

O crescente número de separação de casais é apontado como reflexo do maior período de convivência em ambiente doméstico por conta do isolamento imposto pela covid-19, mas também pela facilitação dos trâmites dos processos, que agora podem ser feitos por meio da internet. Em Rondônia, durante todo o ano passado, foram 1.448 divórcios registrados em cartórios. Neste ano, até maio, já foram 601, de acordo com o CNB.

“O fato é que a pandemia fez com que o mundo jurídico precisasse se adaptar. Ainda falta muita coisa, mas tivemos alguns avanços. As audiências de conciliação passaram a ser virtuais e os próprios atos cartoriais”, destaca Louise Haufes, presidente da 3ª Turma o Tribunal de Ética e Disciplina da Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional Rondônia.

A advogada, especialista em direito de família, explica que a facilidade de dar entrada nos papéis do divórcio de modo eletrônico é um facilitador. A Resolução 100 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), publicada em 2020, estabeleceu que o procedimento pode ser feito em cartório de modo virtual desde o divórcio seja consensual e que o casal não tenha filhos menores.

“Já tive clientes em que uma das partes mora no exterior e fez todo o processo de modo online, sem precisar vir ao Brasil. Outra coisa que evoluiu no direito de família é a citação por WhatsApp. Com a pandemia, muitos juízes passaram a autorizá-la por meio eletrônico, embora ainda haja resistências”, comenta. “O advogado defende amplamente o uso de meios eletrônicos. A formalidade excessiva no âmbito jurídico não pode virar um fetiche. O direito tem que preservar a essência das leis”, finaliza Louise Haufes.

ADVOCACIA IMOBILIÁRIA

Foi durante a crise da covid-19 que Leide da Mata começou a atuar na advocacia imobiliária: maior proximidade com o cliente, que muitas vezes não quer apenas solução jurídica / Foto: Divulgação

De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV) referente a 2020, os contratos de locações de imóveis sofreram um dos maiores índice de reajuste, chegando no mais alto patamar desde 2002, o que impactou diretamente o mercado de aluguéis.

Tendo em vista o fechamento de grande parte do comércio em virtude da pandemia, muitos empresários se viram obrigados a renegociar contratos de locação de imóveis comerciais, aumentando assim as demandas judiciais de pedido de reajustes nos valores de aluguéis.

Em contrapartida, o mercado de compra de imóveis cresceu com a queda das taxas de juros, levando os consumidores a contratar serviços jurídicos especializados em análise de risco para dar mais segurança jurídica às transações imobiliárias.

Neste ponto, a Resolução 100/2020 do CNJ também facilitou a exploração da advocacia imobiliária. A advogada Leide da Mata conta que foi durante a pandemia que encontrou esse nicho de atuação na advocacia, quando analisou as oportunidades e os impactos em diferentes áreas do direito, visualizando no direito imobiliário um mercado ainda inexplorado.

“Hoje entendo que minha atuação vai além do conhecimento técnico, mas é necessário ter uma atitude proativa. Quando sou procurada por um cliente para cuidar de uma transação imobiliária, muitas vezes ele não busca apenas soluções jurídicas, mas também espera o meu dinamismo para auxiliar na sua negociação, aconselhar, ser mediadora, o que difere da advocacia contenciosa, na qual o objetivo é vencer o processo. No direito imobiliário, o maior objetivo é que o negócio do meu ciente seja realizado”, diz.

Para Leide, o advogado durante a pandemia precisou se reinventar e buscar oportunidades de novos negócios. “Costumo dizer que é em momento de grande crise que as oportunidades surgem e que as ideias se tornam realidade”.

AÇÕES TRABALHISTAS

 

Questões trabalhistas em alta na pandemia: “divisor de águas na gestão dos negócios; e a advocacia não fugirá dessa reflexão”, diz Aline Pinheiro / Foto: Divulgação

Em 2021, o número de afastamentos do trabalho por causa da covid-19 mais que dobrou, segundo o Ministério do Trabalho e Previdência. De janeiro a agosto, foram concedidos 81.149 benefícios por incapacidade, o antigo auxílio-doença, um aumento de 119% em relação ao mesmo período de 2020. Além disso, as atividades presenciais na Justiça do Trabalho estão suspensas desde março do ano passado, sem previsão de retorno.

Aline Pinheiro, advogada especialista na área, detalha que a realização de audiência por videoconferência inicialmente não foi bem recebida pelos advogados e pelas partes, principalmente as audiências de instrução e julgamento. “Nem poderia, uma vez que ninguém estava preparado para o procedimento, nem a própria Justiça do Trabalho”, admite.

De acordo com Aline, o processo judicial eletrônico, que já era uma realidade, motivou uma espécie de “segunda onda” de transformação digital do Judiciário, que agora busca incorporar as tecnologias para conseguir produzir mais com menos.

Muitos escritórios e advogados, diz ela, tiveram que se adaptar de forma mais ou menos improvisada para um novo método de trabalho. “As lições sobre essa terrível pandemia permanecerão enraizadas por muito tempo, representando um divisor de águas na vida das pessoas e no modo de gestão dos negócios. A advocacia não fugirá dessa reflexão”, conclui.

sicoob

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